As empresas familiares são muito
importantes para a geração de riqueza, renda e trabalho. Ao mesmo tempo, é
importante destacar que n o Brasil, elas operam em um contexto cultural construído
ao longo de séculos, no qual práticas das Capitanias Hereditárias e do Brasil
Imperial ainda estão presentes em várias dessas organizações. Essa
consideração, conceituamente, também pode ser aplicada a milhões de empresas
familiares existentes por todo o Planeta.
A empresa familiar com ações em
bolsa de valores, mais especificamente, convive com um dilema existencial: por um lado, ela deve ser governada observando
requisitos impostos pela legislação, regulamentação e autoregulação do mercado
de capitais; por outro lado, ela surgiu de uma ou mais famílias controladoras,
responsáveis por suas grandes decisões e as quais durante bom tempo não precisaram
explicar o que faziam a outros agentes. Muitas empresas aprendem a conviver com
esse dilema, com o passar do tempo, mas nem todas, e algumas chegam a fechar
seu capital, retornando ao status
orginal.
Vários estudiosos têm se
empenhado em entender as empresas familiares. Neste artigo, destacamos Kelin
Gersick e seu grupo de pesquisas, que desenvolveram, no livro De geração para geração: ciclos de vida das
empresas familiares (1997),
um sistema segundo o qual a empresa familiar pode ser desdobrada em três
subsistemas independentes e com certo nível de interpenetração entre si: empresa
(gestão), família e propriedade.
John Davis, co-autor do sistema
citado, no artigo Uma radiografia
da relação empresa + família + propriedade (2003) menciona a incorporação da dimensão
tempo às três dimensões supracitadas, considerando que:
1) A empresa
é lançada, expande-se e alcança a maturidade.
2) A
família passa pelas etapas de formação organizacional, entrada dos descendentes
do fundador, trabalho conjunto e transferência de comando para gestores profissionais.
3) A
propriedade passa pelas etapas do proprietário controlador (fundador),
sociedade de irmãos (segunda geração) e consórcio de primos (terceira geração).
Gersick
e seu grupo observam, no artigo Como gerenciar as transições (2003), que os momentos mais desafiadores das
empresas familiares são os pontos de transição de cada um dos três subsistemas;
nessas inflexões, são feitas escolhas que modelarão o futuro organizacional,
com elevado nível de incerteza. Há vários exemplos de empresas familiares que ora atuam nos mercados de
capitais e todas elas tiveram pontos de
mutação, pautados pelo desejo de mudar e por incertezas.
Quais
ingredientes parecem relevantes às empresas familiares que perseguem o
crescimento dos negócios e que não descartam a possibilidade de um dia
participarem do mercado de capitais, de modo a acessar recursos financeiros a
custos mais baixos? Neste breve artigo, relacionamos três requisitos,
não exaustivos, quais sejam:
Empreendedorismo – esteve presente na criação da empresa e não pode
deixar de existir, já que se deseja o crescimento.
Estratégia – ela também não deixará de existir. Precisará ser
construída e implantada considerando os desafios externos e internos da
organizaçao, considerando que a realidade é mutante.
Profissionalismo – este é um quesito a ser intensamente demandado pelos
investidores do mercado de capitais. Temas como ética, governança corporativa,
relacionamento com stakeholders,
prestação de informações aos mesmos, sustentabilidade e gestão de riscos não
podem deixar de existir na pauta da organização.
Este triângulo de virtudes – aliás, também aplicável às empresas não
familiares –, ainda que não exaustivo, ajuda a simplificar o entendimento dos
desafios que se impõem às famílias controladoras de empresas para as quais se
deseja o crescimento.
Mônica Mansur Brandão