sexta-feira, 13 de abril de 2018

Caso WorldCom: a queda do império de telecomunicações


A WorldCom foi criada em 1983, com o nome Long Distance Discount Services (LDDS) e com o objetivo de explorar telecomunicações de longa distância. Ao longo de sua história, ela fez diversas aquisições de empresas de telecom, de variados tamanhos, até se tornar a segunda maior operadora do ramo dos EUA, com liderança na internet. O nome WorldCom passou a ser usado a partir de 1995, com a aquisição da Williams Telecommunications e expressando o crescimento da organização. Entretanto, o perfil do investidor e presidente executivo canadense Bernard Ebbers – conhecido como o cowboy das telecomunicações – e as várias aquisições realizadas criaram uma corporação caracterizada por autocracia, várias culturas internas e pouco foco em controle de riscos.

Boa parte das aquisições do setor de telecom, especialmente nos anos noventa, foi feita por meio da emissão de ações ao público e a WorldCom cresceu em boa medida por meio desse formato. Se o crescimento das operações da Companhia a levou a crescer nos EUA e em vários países (incluindo o Brasil, por meio da compra da Embratel), não se produziu o crescimento de desempenho esperado. Contrariamente às projeções dos executivos da Empresa, comandada de 1985 até abril de 2002 por Ebbers, os preços das comunicações de longa distância caíram consideravelmente, em função da concorrência entre empresas locais e da intensificação da telefonia móvel. Ademais, os serviços de internet evoluíram de maneira bem diferente daquela esperada.

Aqui, cabe uma breve explanação sobre a famosa bolha das empresas pontocom, ocorrida aproximadamente de 1995 a 2000. Nesse período, as empresas de internet registraram forte valorização nos mercados acionários, a qual não guardava correspondência entre o valor de mercado e o valor econômico real dessas companhias. A confiança nos avanços da tecnologia fez com que muitos investidores ignorassem procedimentos tradicionais e prudentes de estimativa do preço de ações para simplesmente acreditarem no futuro. O auge da bolha ocorreu em 10 de março de 2000, quando o índice Nasdaq ultrapassou 5.000 pontos. Entretanto, nos próximos meses daquele ano, a realidade se impôs e várias pontocom adentraram 2001 em processo de venda, fusão ou quebra.

Voltando à Worldcom, em 1998, esta concretizou três aquisições: MCI Communications Corporation, por US 40 bilhões, Brooks Fiber Propertiesc, por US 1.2 bilhões, e CompuServe Corp, por $1.3 billões. Em 1999, a Companhia mudou seu nome para MCI WordCom, retornando em 2000 ao anterior WordCom. Uma nova aquisição anunciada em 1999, da Sprint Communications, pelo valor estimado de US 120 bilhões, foi impedida pelos reguladores estadunidenses e europeus, com o propósito de preservar a concorrência nas telecomunicações e prevenir abusos de um grande poder que seria acumulado pela WordCom se a transação ocorresse. Em 1999, o preço das ações da Companhia alcançou o pico de US$ 64.2.

Pressionados pela quebra da bolha das empresas pontocom, ocorrida em 2000, e por investidores para que a Companhia apresentasse bons resultados, os executivos da WordCom decidiram adotar medidas fraudulentas para que esta aparentasse bom desempenho. Em 2001 e parte de 2002, com ciência de Bernard Ebbers, presidente executivo, e sob a coordenação de Scott D. Sullivan, diretor financeiro, a Companhia, além de fazer provisionamentos de despesas para o futuro, contabilizou despesas como investimentos, o que é algo grave em contabilidade. A auditoria interna da Empresa, comandada pela executiva Cynthia Cooper, apontou os problemas, mas a auditora externa, Arthur Andersen, a mesma do caso Enron, nada apontou. Por sua atuação, a executiva não foi penalizada em investigações dos órgãos oficiais dos EUA sobre o caso.

No dia 25 de junho de 2002, a WordCom anunciou ao mercado que faria uma revisão do valor de US$ 3,85 bilhões em suas demonstrações financeiras, o que causou grande perplexidade em investidores menos atentos ou tecnicamente pouco orientados, já que os lucros antes informados subitamente se transformaram em grandes perdas. Na mesma data, o diretor financeiro Scott Sullivan foi demitido.

No dia 1 de julho, a Companhia encaminhou à Securities Exchange Comission (SEC) um documento detalhando seus problemas contábeis e explicando que em 2001 e no primeiro trimestre de 2002 lançou taxas associadas ao uso de serviços de rede e instalações de terceiros como investimentos (ativos fixos) entre outros tópicos. No dia 2 de julho, as ações da Companhia valiam apenas US$ 0.10.

Em 21 de julho, por fim, a Empresa recorreu ao conhecido Capítulo 11 da Lei de falências dos EUA, a qual permite que empresas com problemas financeiros desse País possam se reorganizar. As dívidas da WorldCom com bancos chegavam a cerca de US 32 bilhões e entre cerca de 1.000 credores, havia grandes instituições financeiras como J. P. Morgan Chase, Citibank, Goldman Sachs e Credit Suisse First Boston entre outras. Diante das fraudes, os credores se retraíram quanto a conceder novos empréstimos e a Companhia se viu sem alternativa, a não ser recorrer à Lei.

Ressalta-se que a manipulação da contabilidade não foi o único escândalo da WorldCom que veio a público. Em abril de 2002, o presidente Bernard Ebbers teve que renunciar ao cargo, em meio a uma investigação da SEC sobre um empréstimo concedido ao mesmo pela Empresa, de montante superior a US$ 400 milhões, visando adquirir ações da própria WorldCom. O executivo John W. Sidgmore, egresso da Companhia, assumiu sua presidência, vindo a falecer de complicações de saúde no final de 2003.

Ainda em 2003, o executivo Michael David Capellas, egresso da Compaq, assumiu a presidência da então MCI – em 12 de abril de 2003, a WorldCom assumira esse nome. Capellas reestruturou a Companhia e a conduziu até a sua aquisição pela VerizonCommunications, finalizada em 6 de janeiro de 2006. Após adquirida pela Verizon, a MCI passou a integrar a Verizon Business, uma divisão especializada em clientes corporativos e do governo e Capellas, por seu turno, assumiu outros desafios profissionais.

A WorldCom não resistiu na forma como era antes apenas em função das consequências das fraudes nela ocorridas. Ocorre que o setor de telecomunicações, muito dinâmico, seguiu evoluindo e a condução da organização nos anos seguintes ao anúncio de seu default teve que lidar com essa realidade. Adicionalmente, a Companhia cresceu, em grande medida, durante a bolha das empresas pontocom e, sem deixar de reconhecer a gravidade das decisões dos executivos responsáveis pelas fraudes, ela não deixou de ser afetada pela ilusão de um grande crescimento que a tecnologia supostamente criaria e que não se materializou para muitas empresas.

Quanto a Bernard Ebbers, Scott Sullivan e outros executivos envolvidos com as fraudes, eles foram sentenciados a penas distintas. Ebbers e Sullivan foram condenados, respectivamente, a 25 e 5 anos de prisão, sendo que o segundo fez um acordo com o Poder Judiciário dos EUA para depor contra o primeiro. A maior parte dos bens de Ebbers, outrora bilionário, foi direcionada para compensar investidores lesados pelo default da WorldCom e o ex-investidor e executivo iniciou o cumprimento de sua sentença em 2005.