A empresa mineradora
Samarco Mineração S/A, de propriedade da brasileira Vale S/A e da anglo-australiana
BHP Billiton (com participações de 50%/50%), ou melhor dizendo, uma de suas áreas de acumulação de resíduos minerais foi o principal palco do maior
desastre ambiental ocorrido no Brasil: no fatídico dia 5 de novembro de
2015, quinta-feira, uma barragem de rejeitos da Samarco, no
município de Mariana, se rompeu. A enxurrada de lama tóxica da barragem de
Fundão avançou sobre terras e rios, matando 19 pessoas e criando um dano
ambiental sem precedentes no País.
A onda de lama resultante
da ruptura da barragem de Fundão soterrou o subdistrito de Bento Gonçalves,
atingiu municípios próximos dos leitos do Rio Doce e seus afluentes e chegou ao
Oceano Atlântico, no litoral do Espírito Santo. Mais de 330 hectares de Mata
Atlântica entre Mariana e Ponte Nova, distantes em cerca de 114 km, foram destruídos,
sendo que a maior parte dessas terras era mata nativa. Destaca-se que a bacia
do Rio Doce alcança 228 municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo, vários dos
quais dela se abasteciam de água.
Rejeitos vazados da barragem de Fundão teriam passado sobre a barragem de Santarém, mas sem que essa se rompesse. Entretanto, a ruptura da primeira foi suficiente para criar uma catástrofe ambiental sem
precedentes, ceifando vidas, destruindo o meio ambiente por onde a onda de lama
passou e prejudicando – eventualmente, eliminando – o trabalho de muitas
pessoas.
O rompimento da barragem em
Mariana não foi o primeiro episódio provocado por operações da Samarco com danos socioambientais, já que houve outros. Em 2014, a Companhia
foi acusada de provocar poluição em Vitória, capital do Espírito Santo, o que
culminou na criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Pó Preto,
instaurada pela Assembleia Legislativa do Estado. Após cerca de oito
meses de trabalho, a CPI identificou que a Samarco, a Vale e a Arcelor Mital
foram as principais responsáveis pela poluição da capital capixaba.
No dia 9 de novembro de
2015, o governo do estado de Minas Gerais embargou as atividades da Samarco. No dia 20 de janeiro de
2016, o conselho de administração da Companhia aceitou os pedidos de afastamento
de Ricardo Vescovi e Kleber Terra, respectivamente presidente executivo e
diretor de operações, sendo que ambos estão entre os indiciados por crime
ambiental.
Em 2 de março de 2016, foi
assinado um Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC) entre a
Advocacia Geral da União, o Ministério do Meio Ambiente, os governos estaduais
de Minas Gerais e Espírito Santo, Samarco, Vale e BHP Billiton. Em 25 de
junho de 2018, foi firmado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), alterando
o TTAC inicial e ampliando a participação de atingidos no acordo (houve
críticas de que o TTAC não os teria incluído). Também tratado como TAC
Governança (TAC Gov), o segundo acordo estabelece, entre outras disposições:
1) Aprimorar a participação
das pessoas atingidas no processo de reparação de impactos do rompimento da
barragem de Fundão.
2) Extinguir a Ação Civil
Pública (ACP) de R$ 20 bilhões, criada pela União e os Estados de Minas Gerais
e Espírito Santo contra a Samarco, Vale e BHP Billiton, bem como suspender a ACP
de R$ 155 bilhões, criada pelo Ministério Público Federal (MPF), durante 24
meses, para renegociar os programas do TTAC, exceto no que tange a alguns
pedidos contemplados pelo TAC Gov, que serão extintos.
3) Formalizar a validade do
TTAC e estabelecer um processo de renegociação de seus programas nos próximos dois anos.
Após a assinatura do TTAC, foi
criada a Fundação Renova, entidade responsável por conduzir diversos programas
de reparação, restauração e recuperação socioeconômica e socioambiental das áreas
atingidas pela onda de lama egressa da barragem de Fundão. A Renova iniciou suas
atividades em agosto de 2016 e seus 42 programas estão distribuídos entre três
eixos de atuação:
Os 42 programas a serem implementados pela Renova podem ser acompanhados no site
da Fundação e terão 15 anos para finalização. Alguns já se encontram avançados,
como os programas emergenciais de contenção de rejeitos e controle de erosão; outros
estão em andamento, como o de recuperação de nascentes. Mas existem pendências
e a Fundação Renova tem recebido notificações e multas, as quais tem buscado administrar. Exemplifica-se com o caso da área da usina hidrelétrica Risoleta Neves (Candonga, MG), a qual recebeu rejeitos que, se não
forem retirados, poderão contaminar ainda mais o rio Doce.
Com respeito ao programa
denominado Ressarcimento e Indenização dos Impactados, acordos de indenizações na esfera civil têm sido feitos. O
propósito deste programa específico é ressarcir pessoas, micro e pequenas
empresas que tenham sofrido danos materiais, morais ou perdas em suas
atividades econômicas, em decorrência do rompimento da barragem de Fundão. A
ideia é o ressarcimento rápido e desburocratizado, sem a necessidade de ação
judicial e o acompanhamento é feito mensalmente desde setembro de 2016.
Se na esfera cível ações têm
sido empreendidas, mesmo com diversos percalços e considerando que as providências se desenvolverão paulatinamente, na esfera criminal, o processo tem sido extremamente
lento. A ação penal tem mais de 12 mil páginas e tramita na Justiça
Federal, em Ponte Nova (MG). Ainda em primeira instância, o processo está a cargo de um único juiz federal, Jacques Queiroz Ferreira.
Em outubro de 2016, o
Ministério Público Federal (MPF) denunciou a Samarco, Vale e BHP Billiton, bem como
a empresa de consultoria VogBR, a qual assinou o laudo de estabilidade da
barragem de Fundão. Ademais, 22 pessoas, foram denunciadas como criminosas, incluindo o ex-presidente e o ex-diretor de operações da Samarco à época do rompimento da barragem.
O processo, após mais de três anos, já foi atrasado duas vezes. A primeira vez ocorreu em 2017, quando a defesa dos réus questionou provas apresentadas. A
segunda se deu em outubro de 2018, após um habeas corpus concedido pelo Tribunal Regional Federal 1 (TRF1) a favor de
um réu. Sobre o segundo evento, o magistrado responsável pelo
processo alegou ser necessário aguardar o julgamento do recurso interposto
pelo Ministério Público Federal (MPF). Não há prazo para o processo ser
encerrado, o que poderá levar anos.
Por sua conta, Samarco,
Vale e BHP Billinton contrataram o escritório Cleary Gottlieb Steen &
Hamilton LLP, para apurar as causas do rompimento da barragem de Fundão. Com a
participação de especialistas do EUA, Canadá e Brasil, produziram-se as
informações técnicas fornecidas no endereço fundaoinvestigation.com.
Por fim, enquanto o caso
Mariana tramita, com andamentos na esfera cível e evolução sofrível na esfera
criminal, e enquanto muitas famílias tentam reconstruir suas vidas, no dia 25 de janeiro, outra barragem – desta feita, de propriedade da
própria Vale – a barragem do Córrego do Feijão, no município de Brumadinho -, se
rompeu, com a expectativa de mais de 300 mortes e desaparecimentos. Se com respeito ao meio ambiente o desastre de Mariana é o maior do Brasil, em termos de perdas de vida, o de Brumadinho será mais de 10 vezes maior.
Fontes:
Samarco
Fundação Renova
Relatório de Administração da Samarco (2017)
Programas de recuperação de danos devem durar 15 anos (Valor)
Rompimento de barragem em Mariana: perguntas e respostas (G1)
Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC)
Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)
Estudo Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP
Outras indicados no texto.
Samarco
Fundação Renova
Relatório de Administração da Samarco (2017)
Programas de recuperação de danos devem durar 15 anos (Valor)
Rompimento de barragem em Mariana: perguntas e respostas (G1)
Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC)
Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)
Estudo Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP
Outras indicados no texto.