Situação hipotética
Imagine-se o mesmo grupo empresarial hipotético do post Quando os familiares discordam sobre o futuro da empresa, cujos
fundadores e acionistas controladores (majoritários) são os membros integrantes
de uma família. Imagine-se que haja sócios não controladores (minoritários),
quase sempre alheios às discussões de assuntos relevantes sobre o grupo.
Assuma-se ainda que um dos filhos do fundador exerça a
presidência executiva e que outros membros da família ocupem
posições no conselho de administração e na diretoria executiva do grupo
empresarial. Os sócios não controladores confiam
substancialmente na administração.
O presidente
executivo concebe planos de expandir o grupo, mas os demais integrantes da família
não concordam com a lógica de crescimento proposta, que exigirá a presença de
outros sócios não familiares, com poder de veto nas decisões. Sem esses novos
sócios, não haverá o capital exigido para o crescimento.
A questão dos minoritários
Chamamos a atenção dos leitores sobre um aspecto que não
foi explorado na primeira reflexão sobre a situação acima descrita: a questão dos sócios não controladores. Nesse sentido,
são pontos importantes:
1) Há, na organização hipotética considerada, sócios não
controladores (minoritários); na grande maioria das situações, eles estão alheios às
discussões de assuntos relevantes sobre o grupo.
2) Os sócios não controladores confiem substancialmente nos
sócios controladores e na administração, onde os controladores estão muito presentes;
por essa razão, aparentemente não se envolvem nas discussões sobre temas relevantes.
3) Ao mesmo tempo, algo muito relevante e que pode
alterar o patrimônio de todos os sócios está em discussão: a possibilidade versus a impossibilidade de entrada de
novos sócios na empresa, cujo ingresso, aportando capital novo, poderá ser
positivo para o patrimônio de todos os sócios.
4) Adicionalmente, há um desalinhamento de visões entre
membros da família controladora que pode mudar o futuro da empresa, aumentando
ou não seu valor econômico. Mesmo assim, os sócios não controladores aparentemente não
percebem o conflito. Não percebem ou não se interessam? Ou não são bem informados?
Conforme se percebe, por maior que seja a confiança dos
sócios não controladores nos sócios controladores, não deixa de estranhar o seu
distanciamento em relação ao que ora ocorre – a proposta do presidente
executivo e a resistência dos demais membros da família controladora em aceitar
tal proposta. Em que pese o estranhamento citado, na prática, muitos sócios não
controladores não acompanham o que ocorrem nas empresas dos quais eles são detentores
de capital.
É importante dizer que nas companhias com ações listadas
em bolsa de valores – e este não é o caso da organização do exemplo hipotético –
certa assimetria informacional é compreensível, em função da restrição que a
própria Lei das Sociedades Anônimas (6.404, de 15/12/1976 e duas revisões) impõe
aos administradores das empresas. Mas isso não implica o quase completo
distanciamento, já que essas organizações devem prestar informações básicas a todo o
conjunto de acionistas, resguardas as disposições legais.
O grupo empresarial hipotético aqui tratado não é uma
sociedade anônima, ainda que adote algumas práticas interessantes, como dispor de um conselho de administração (poderá vir a ser se aceitar novos sócios, esta é uma das
possibilidades de crescimento dos seus negócios), mas, mesmo assim, é recomendável que venha trabalhando por meio de boas práticas de governança corporativa em relação
os sócios não controladores (minoritários). Destes, espera-se também bom nível de interesse sobre o negócio e seu futuro, mesmo que exista alta confiança na administração da empresa.
Assim sendo, e em complementação às quatro considerações
acima, consideramos pertinentes os seguintes questionamentos:
1) Qual é a estrutura de propriedade exata do grupo
empresarial? Dito de outra forma, quais são as participações de cada sócio, entre controladores e
não controladores, no capital?
2) Quem são, exatamente, os sócios não controladores?
Pessoas físicas? Pessoas jurídicas? Ambas as categorias existem?
3) Quais são as práticas de governança corporativa no que
concerne aos sócios não controladores, quando se consideram os princípios clássicos
da transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa?
4) Em que medida essas práticas se aproximam
de boas práticas requeridas de empresas com governança sólida? As práticas existentes contribuem para uma arquitetura organizacional desejável na esfera da cúpula da organização, sob o ângulo da totalidade dos sócios?
A grande confiança percebida nos sócios não controladores em relação aos
sócios controladores, pode estar embasada em boas práticas de governança? Sim, é
possível, mas a descrição do caso não explicita este aspecto. Adicionalmente, há que refletir se faz sentido que os
minoritários nada saibam sobre a proposta presidencial e a oposição à mesma. Haverá transparência nesta organização hipotética?
Pode ser compreensível que a proposta de agregar novos sócios, em um primeiro momento, se restrinja ao contexto da família. Mas que o impasse perdure sem transparência, ou então que seja
resolvido sem que os sócios não controladores possam opinar,
não é recomendável, sob o prisma de uma boa governança. Afinal, eles, os minoritários, precisam ter a chance entender e de concordar ou não com o futuro proposto, tomando decisões que sejam interessantes para o seu patrimônio. No limite, até se desfazendo de sua participação na empresa, se o futuro citado não parecer promissor.
Fonte original do caso:
Maria Aparecida Hess Loures Paranhos e Mônica Mansur
Brandão
Mônica Mansur Brandão