Uma franquia é um negócio cujo modelo
de operação já existe, supostamente é bem-sucedido e seu criador autoriza que
outros empreendedores o repliquem, sob condições previa e rigidamente
estabelecidas.
Em tese, ser franqueado é menos
arriscado do que criar um negócio que ainda precisa ser construído e testado.
Ao mesmo tempo, ao ser autorizado a operar como integrante de uma rede de franchising, o franqueado passa a
integrar um sistema de empreendimentos
ou sistema empreendedor, o qual precisa ser muito bem avaliado, a fim de que não
se perca o investimento – por vezes, até bens pessoais –, a fim de honrar
compromissos contratualmente assumidos. Os riscos podem não ser exatamente
pequenos, conforme se imagina.
Já sob o ângulo do franqueador,
os cuidados também precisam ser grandes, a responsabilidade é considerável. Ele
tem a responsabilidade de franquear modelos de negócios com alta
chance de sucesso em sua replicação por terceiros, fazer boas escolhas sobre
quem participará do sistema empreendedor, monitorar
os franqueados e ajudá-los assegurar a fidelidade aos fundamentos do negócio e
a observância à qualidade de produtos e serviços. Em um nível mais elevado, deverão
zelar pela saúde empresarial de toda
a rede franqueador-franqueados, com bom monitoramento sistêmico e evitando disputas de
mercado entre unidades, que venham a enfraquecê-las.
Onde reside o centro da
governança de uma rede de franqueados – o centro do poder organizacional? A
resposta parece evidente: no franqueador. Ele é o criador do modelo de negócio.
Ele é quem estabelece as regras sob as quais o franqueado operará, considerando
os instrumentos formais que regulam a operação do sistema empreendedor. Por deter o negócio a ser replicado por unidades
franqueadas, por tê-lo aplicado e testado em grande medida e com grande
sucesso, por criar as regras de relacionamento com os franqueados, o
franqueador é o centro de poder político e econômico do sistema de franchising.
Além da Constituição e das leis
do Brasil, as franquias em nosso País são regidas pela Lei das Franquias (8.955, de 15/12/1994) que, em seu artigo 2º,
estabelece a obrigatoriedade de que os franqueadores disponibilizem uma Circular de Oferta de Franquia (COF),
contendo diversas informações importantes para franqueados, em linguagem clara
e acessível. O candidato a franqueado certamente não precisará ser bacharel em direito, mas necessitará ter bom conhecimento sobre a Lei das Franquias, as regras estabelecidas na COF e os contratos a
serem firmados com o franqueador. A compreensão da Lei será facilitada pela
constatação de que ela tem apenas 11 artigos, os quais precisam ser bem
compreendidos.
Como um instrumento de governança
corporativa e gestão, que estabelece a natureza do relacionamento
franqueador-franqueado, pautada por forte assimetria de poder entre estas
partes, a COF precisa ser muito bem entendida e avaliada antes da decisão de
empreender. E além da COF, haverá contratos a firmar entre o franqueador e o
franqueado, também instrumentos de governança e gestão, que precisam ser muito
bem compreendidos e avaliados, em todas as suas cláusulas.
Analisar o franqueador e as
unidades já franqueadas de um sistema de franchising
onde se cogita atuar, ou seja, o sistema empreendedor acima mencionado, a COF e os contratos a firmar e o modelo de negócio expresso
nesses instrumentos ajudará substancialmente o candidato a franqueado a antecipar
e prevenir problemas futuros. E há que pensar não apenas em gestão operacional,
mas em governança corporativa. A análise precisa ser exaustiva, fundamentada, não
apressada e ajudada por especialistas no assunto, com experiência em redes de franchising. Decisões apressadas e não
fundamentadas podem ter alto custo e, aliás, isto vale para outras formas de
empreender também.
Governança corporativa tem a ver,
de modo geral, com quatro princípios clássicos: transparência, equidade,
prestação de contas e responsabilidade corporativa. Como se pode considerar um
sistema de franchising, à luz destes
quatro princípios?
No que tange à transparência, o
franqueador precisa disponibilizar a COF previamente, conforme determina a Lei das Franquias; precisa, ainda, disponibilizar
de forma transparente, orientações seguras às unidades franqueadas. O
franqueado, por seu turno, deve esclarecer para o franqueador suas dúvidas e dificuldades
do dia-a-dia. Idealmente, o franqueado também deveria poder compartilhar
eventuais descobertas com potencial para favorecer toda a rede de franchising, com a segurança de que suas
sugestões seriam, no mínimo, apreciadas pelo franqueador.
No que concerne à equidade, as unidades
franqueadas devem receber a mesma atenção, devendo os relacionamentos
franqueador-franqueados serem equânimes quanto a sistemas e suporte provido aos
empreendedores. A ideia básica aqui é a de se ter um sistema que seja essencialmente
justo e sem diferenças que não façam sentido à luz do conceito de justiça.
Com respeito à prestação de
contas, não basta aos franqueados apresentarem resultados; o franqueador também
necessita alinhar a rede de franchising
em relação ao seu desempenho, digamos, corporativo, ou melhor dizendo, sistêmico, demonstrando sua expansão,
eficiência (fazer bem feito) e eficácia (fazer o que precisa ser feito).
Quanto à responsabilidade, se o
franqueado precisa seguir as disposições dos instrumentos formais estabelecidos
e honrar seus compromissos (e por vezes, isto se dá com sacrifício do patrimônio
pessoal), o franqueador tem a responsabilidade de contribuir assertivamente
para oferecer um modelo de negócio vencedor e de atuar também assertivamente para tornar
o sistema de franchising do qual ele
é o centro de poder um ambiente de ganha-ganha.
Conforme se percebe, a decisão de
empreender pelo modelo de franchising não é trivial: é preciso identificar se vale
a pena empreender com a lógica desse modelo e se o franqueador realmente merece
que com ele se estabeleça um relacionamento confiável de trabalho.
Continua no artigo
Mônica Mansur Brandão