Inicialmente, cabe indagar: o que
é cultura organizacional? Este termo é
definido de várias formas na literatura acadêmica, mas, para fins do presente
artigo, consideramos que ele seja sinônimo de regras do jogo não escritas.
A definição anterior,
infelizmente, não é nossa, mas é aquela apresentada pelo ilustre economista
Douglass North, vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 1993, no livro Institutions,
institutional change and economic performance – political economy of
institutions and decisions (1990). Ainda
que direcionada à Ciência Econômica, a definição do professor North pode ser
transposta à Ciência Administrativa. É o que fazemos neste artigo, visando meramente favorecer sua compreensão.
Por que as regras do jogo não
escritas na organização devem importar aos conselhos de administração? O artigo
Culture risk oversight: measures the
board can take (27/8/2019), publicado no Wall Street Journal por Laura Skov,
especialista da Deloitte, apresenta um conjunto de reflexões sobre a importância
da cultura para os conselhos. Dessas considerações, extraímos três pontos, os
quais nos parecem mais relevantes:
1) A cultura é um ativo sem preço.
2) Uma cultura danificada pode criar disfunções na organização, colocando em risco ativos críticos.
3) A cultura pode fazer ou quebrar uma organização.
Assumindo que a cultura – as regras do jogo não escritas da
organização – seja “algo” que pode definir o futuro organizacional, e ainda,
que o conselho de administração seja o efetivo guardião desse futuro, faz
sentido reconhecer que o tema cultura é da esfera dos conselhos, não devendo
ficar relegado apenas às diretorias executivas que, muitas vezes se tornam
envolvidas com muitos outros assuntos candentes e terminam por não dedicar
tempo ao diagnóstico, à análise e à melhoria da cultura. Aliás, o envolvimento
dos conselhos no tema cultura inevitavelmente o priorizará nas agendas das assoberbadas
diretorias das organizações, envolvidas - como deve ser - no dia-a-dia organizacional.
Como então endereçar a cultura em
âmbito dos conselhos? O desafio não é trivial, pois a cultura organizacional é,
frequentemente, percebida como um assunto soft,
no sentido de não ser palpável, tangível, concreto e sujeito à intervenção administrativa.
Ao mesmo tempo, os administradores das organizações, em todos os níveis, necessitam
endereçar questões importantes por meio de uma visão crítica em que a
objetividade e a subjetividade ajudem efetivamente a pensar e agir.
O artigo de Laura Skov propõe que
o enfoque para tratar a cultura no ambiente dos conselhos de administração seja
o dos riscos. Faz sentido, considerando os três pontos relevantes acima
relacionados, especialmente o terceiro – a cultura pode fazer ou quebrar uma
organização. Nessa perspectiva, o endereçamento da cultura como fator de risco cria
a necessidade de um diagnóstico capaz de fornecer aos conselheiros e diretores um bom
retrato da cultura vigente, apontando gaps
(lacunas) entre esta e a cultura desejada e insights
sobre como intervir para mudar ou melhorar a cultura.
Há diferentes formas de construir
diagnósticos culturais e de formatá-los de maneira interessante para que
conselheiros de administração possam fazer o seu trabalho. Sem entrar no mérito
das possíveis ferramentas e das possibilidades que a tecnologia oferece para a
realização de diagnósticos céleres e mesmo em tempo real ao longo de um ano
típico, mencionamos a importância de que os diagnósticos culturais contemplem
questões sobre ética, governança corporativa e sustentabilidade, bem como sobre
gestão da estratégia, de processos e de pessoas, lembrando que em todas essas
disciplinas, o relacionamento com stakeholders pode ser crucial para o
sucesso (ou o insucesso) da organização.
Por fim, acreditamos que pouco se
discute cultura nos conselhos administrativos de empresas no Brasil e em outros
países, mas também temos a convicção de que este quadro pode mudar. Os
conselhos de administração e, de forma mais ampla, o sistema de governança das
organizações da economia são construções dinâmicas e que evoluem, assim como os
seres humanos e as regras do jogo que eles criam.
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