Há 14
anos, Juan Antonio Fernández, professor de administração de empresas da China
Europe International Business School, sediada em Xangai (China), reportou em um
artigo uma pequena história sobre Sun Tzu, autor do livro A arte da guerra. Denominado Ensinamentos
de A arte da guerra (HSM Managment, março-abril 2005), o artigo contou a
pequena história que resumimos a seguir.
Ho-Lu, rei do Estado de Wu, leu A arte da
guerra e convocou o autor ao seu palácio, visando testar a eficiência de suas
idéias. Sun Tzu aceitou o desafio, pedindo permissão para trabalhar com as
concubinas do rei em um exercício, com uma condição: suas decisões deveriam ser
acatadas pelo soberano. Ho-Lu concordou com a condição.
Sun Tzu dividiu as mulheres em dois grupos,
cada um comandado por uma concubina favorita do rei, explicando os exercícios
militares que pretendia que fossem feitos. Após isso, perguntou se as mulheres
haviam compreendido as regras e todas concordaram. Mas, quando Sun Tzu começou
a dar ordens, as concubinas começaram a rir. O filósofo repetiu suas ordens, e
o efeito foi o mesmo: novas risadas. Sun Tzu então disse: “Se as regras estão
devidamente esclarecidas, mas ninguém as segue, a culpa é dos líderes”. E assim
dizendo, ordenou o enforcamento das duas favoritas do rei.
O rei Ho-Lu tentou evitar a execução da
ordem, dizendo ter compreendido o sistema, mas não conseguiu demover Sun Tzu de
sua decisão. O filósofo prosseguiu nos treinamentos com outras comandantes.
Dessa vez, os exercícios militares foram executados conforme as instruções.
Reza a lenda que Sun Tzu teria alertado o rei, em estado de depressão: “Vossa
Majestade aprecia as palavras, mas não tem a coragem necessária para colocá-las
em prática”.
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A história de feminicídio acima descrita seria inaceitável nos tempos atuais e não deve ser tomada ao pé da letra. Mas sobre ela é possível fazer uma reflexão sobre liderança, sobre como liderar. Transpondo tal história para termos atuais, diríamos: Sun Tzu
nela preconiza um modelo de liderança baseado em disciplina e coerção. Esta é a nossa visão desta breve história.
Sobre disciplina, acreditamos que ela seja importante – na verdade, fundamental – para
perseguir objetivos e metas, mas com observação atenta do ambiente externo, que
pode determinar mudanças de rumo. Entretanto, o exercício da liderança por meio
da coerção, de ameaçar liderados de perderem algo que lhes é absolutamente preciso,
não é algo adequado ao ambiente organizacional. Se foi em tempos passados, há
muito tal abordagem perdeu o sentido; ao menos, nas organizações realmente
modernas.
Ocorre
que o poder de desligar pessoas de uma organização, especialmente no mundo privado,
está nas mãos de seus gestores. A ameaça de perda do trabalho já é algo concreto,
não é preciso reforçá-la a cada dia. Assim, a liderança intrinsecamente boa tem
a ver com motivar – e é motivando que os bons líderes realmente fazem a
diferença.
Motivar
liderando requer conhecer a famosa pirâmide que emerge dos trabalhos de Abraham
Harold Maslow - a pirâmide de Maslow -, na qual o reconhecido estudioso estadunidense identifica as cinco
grandes categorias de necessidades básicas do ser humano: fisiológicas, de
segurança, sociais, de estima e de realização pessoal. Pode-se questionar a
ideia de hierarquia entre estas necessidades, mas não sua existência. Motivar
tem a ver com a compreensão dessas necessidades.
Liderar
ganha complexidade nas sociedades anônimas, com milhares de acionistas e
estruturas como conselhos de administração, diretorias executivas e outros
órgãos de governança corporativa. Lembrando que essas sociedades são empresas
submetidas a substancial controle externo, o que aumenta o desafio dos líderes;
afinal, deles se espera a publicação de resultados, a serem alcançados
fundamentalmente com base no engajamento de pessoas motivadas.
A
partir do exposto, podemos afirmar que a liderança é um dos temas mais
importantes da agenda dos conselhos de administração e das diretorias
executivas. Por uma questão de administração de riscos – uma organização
precisa de bons líderes –, mas principalmente de sustentabilidade, com foco em
uma visão de longo prazo.
Entre
os livros sobre liderança que tivemos a oportunidade de ler, aquele que mais
nos impressionou denomina-se Maestro
e foi escrito pelo maestro Rober Nierenberg. O autor se baseou em sua própria
experiência para relatar a história de um executivo que conquista melhores
resultados para sua empresa, após conhecer um regente fora de série e aplicar
seus ensinamentos no trabalho. Inspirado nos maestros e nas orquestras musicais
reais, Maestro apresenta um modelo de
liderança que procura extrair o melhor dos músicos – pessoas altamente capacitadas,
que precisam trabalhar de maneira disciplinada e que devem ser respeitadas.
Retornaremos
em breve com um artigo específico sobre Maestro.
Por ora, apenas diremos – retornando à história de Sun Tzu – que concordamos
com a frase final da história: realmente, é preciso ter coragem para colocar
boas ideias em prática. Mas elas têm que ser realmente boas para a situação que
se considera. A nosso ver, os líderes organizacionais são como maestros, e seus
liderados, como músicos. Nesse contexto, disciplina faz grande sentido, mas
coerção, jamais.
Mônica Mansur Brandão