Em 2019, o Ibovespa se apreciou bem mais do que a inflação, com uma valorização superior a 30%. No mesmo período, registrou-se a queda dos juros do mercado financeiro doméstico. O que não foi um fenômeno apenas nacional, pois alguns países, tais como Alemanha, França, Japão e Bélgica, registraram quedas nos juros e mesmo taxas de juros negativas.
Embora tenha sido um dos fatores que
contribuíram para o ótimo desempenho do mercado de ações nacional no ano
passado, não o único – as expectativas de investidores em relação a possíveis
reformas institucionais ajudaram bastante a melhorar o desempenho do Ibovespa –,
faz sentido afirmar que a queda nos juros foi um vetor favorável ao bom
desempenho do Ibovespa. Afinal, com juros altos, é bem mais difícil obter
retornos mais elevados com ações, já que outros ativos remuneram bem os
investidores; por exemplo, títulos públicos, certificados bancários e algumas opções
de fundos de investimento.
Nesse contexto, pode-se indagar: a
grande valorização do Ibovespa em 2019 e em parte de 2020 se trata de uma
bolha especulativa? De acordo com o economista Roberto Teixeira da Costa,
criador da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), não se percebem sinais de uma
bolha especulativa no mercado de capitais doméstico. Esta foi sua afirmativa em
artigo recentemente publicado na Revista RI – Relações com Investidores deste
mês de fevereiro (“Bolha especulativa no mercado de capitais?”).
O ex-presidente da CVM lembra que o
mercado de capitais nacional já conviveu ao longo de sua história com duas
bolhas especulativas: uma em 1889-90, período em que Rui Barbosa foi ministro da
Fazenda, e outra na transição entre os anos sessenta e setenta (nos primórdios
dos governos militares). Entretanto, para Teixeira da Costa, o quadro atual é bem menos
propício à criação de uma bolha; em sua visão, existem condições que tornam o
mercado bem mais protegido do que no passado.
Entre as condições que diferenciam o
mercado de capitais atual daquele de tempos pregressos, segundo Roberto Teixeira da Costa, mencionam-se: a existência de instituições financeiras
preparadas; regulação atualizada e uma CVM mais exigente quando às informações
prestadas aos investidores, educação financeira, jornalismo econômico
aprimorado, mecanismos que reduzem, em grande medida, o risco de especuladores
e a não existência de um “clima de euforia” entre investidores, típico de
bolhas especulativas.
Após a publicação da Revista RI em sua
edição de fevereiro, na quarta-feira de cinzas, dia 26 de fevereiro, ou seja, nesta semana, o Ibovespa
sofreu uma forte queda, de 7%, refletindo os temores, em âmbito mundial, em
relação à transmissão do coronavírus. O mundo – e os investidores e
profissionais de investimento – mostram receio desse vírus egresso da
China, do qual pouco ainda se sabe, especialmente sobre como combatê-lo mais assertivamente sob o prisma médico, já que ainda não existe uma vacina disponível para isso. Na quinta-feira (27), isto é, hoje, assistiu-se a uma nova queda no Ibovespa, desta feita de 2,6%.
O ambiente político-institucional do
momento também pode ter contribuído para as quedas citadas, em alguma medida. Na
visão de vários analistas e profissionais de investimento, o modus operandi do presidente Jair Messias Bolsonaro, em termos de seu relacionamento
com os Poderes Legislativo e Judiciário e a imprensa pode dificultar a
aprovação de medidas consideradas importantes para equilibrar as finanças
nacionais e permitir o crescimento.
Investidores e profissionais de
investimento do mercado de capitais nacional têm expectativas quanto a reformas
que consideram muito relevantes para a economia do Brasil. Após a reforma da
Previdência, eles anseiam por grandes reformas nas searas tributária e administrativa.
A frustração dessas expectativas tem potencial para desvalorizar o Ibovespa. Não
com o caráter do estouro de uma bolha, mas refletindo, em boa medida, e sem
perder de vista outros fatores que formam o preço de ativos do mercado de
capitais (como por exemplo, o medo do coronavírus), o desapontamento em relação à gestão da economia nacional. E ainda existe o risco coronavírus.
Mônica Mansur Brandão (atualizado em 10/3/2020)
Mônica Mansur Brandão (atualizado em 10/3/2020)